Ando
estranha, meio natureza morta talvez, não sei ao certo, murcha de fato. Ando
dividida ao meio, com desejos incertos e vontades que não são minhas. De dia
sou deserto, áspera e quente, morro de sede, de desejos, deliro sombria, me
inquieto. De noite chovo, trovejo e relampeio sem parar, tremo de frio,
solitária, despejo sobre meu corpo águas profundas, águas de sal. Amanheço e
meu sol nada ilumina, nada aquece, sou só aparência.
As vezes
afogo-me dentro de mim mesma, sufoco-me de agonia: anseio por uma vontade louca
de respirar desesperadamente e assim me revigorar na exatidão do momento
certo,e então, ahh estou chegando quase lá, chego tão perto, caiu invalida e
morro outra vez. Tento respirar. Ahhh. Alivio. Ainda não sei quem sou.
As fases da
lua não são suficiente para guardar dentro delas minhas mudanças, que há dias
emudeçem, nem Cecília Meireles me entenderia, precisa então, a lua, de mais
fases. Se sou cheia, não mínguo, se eu cresço, não sou nova. Sou lua do avesso,
ninguém conhece. Venham até a mim, descobrir-me por inteira.
Certa vez
um cara me fuçou as entranhas, penetrou minha alma, eu, muito inocente, deixei
que fizesse tal asneira, ele me remexeu de um jeito bem forte, eu fechei os
olhos e permiti. Ele me adentrou bem fundo, dizia me amar lindamente, que nas
cegas eu poderia andar, que nada de ruim me aconteceria, ele estaria lá, a me
proteger. Fui enganada, em uma noite de sábado ou domingo fui traída,
apedrejada e esfaqueada por esse ser que dizia dentro de mim morar. Ele
arrependido veio me pedir perdão, eu mais uma vez me fiz de cega, e o aceitei
de volta, sem crime nem castigos, acreditei novamente naquelas palavras, havia
me feito da presença dele, na sua ausência, eu era nada. O tempo passou, ele
nunca voltou a ser o mesmo, e nem era mais a mesma, estava em alerta, meu
organismo, meio que em modo de defesa o expulsou de mim, foi doloroso sua
saída, dessa vez sem volta, nos separamos de vez.
Desde então
enlouqueci, ando afetada, com um buraco dentro de mim. É um poço sem fundo e
sem luz. Vago a sorrir. Assim, meio que num parto de mim mesmo, me reergo quase
viril, caiu sempre, nunca desisto. Minhas lágrimas vão aguando meu peito
trovador.
Nascerão rosas vermelhas do meu peito, e elas
se alimentarão da dor do meu coração, há pulsar quase em vão, ele que um dia não
me pertenceu, hoje alimentará essas rosas, que
também irão me cravar os espinhos, aumentando então a minha dor, só assim, tu
rosas, serás mais vermelha que já és. Serei uma roseira ambulante, muitos me
roubarão vermelhas pétalas, mas para que havia de ficar comigo, se um dia todas
elas brocharão? Então as levem, e me deixem aqui sozinha. Porém se alguém
descobrir quem sou, me avise por favor. (Ítalo Lima)